Os professores e autores de manuais de História do Brasil, em regra adeptos do decrépito e mofado credo marxista, ao qual o sociólogo Guerreiro Ramos se referiu alhures como “a mais influente força obscurantista da história contemporânea” [1], vêm, há já decênios, amesquinhando os construtores da Nação Brasileira, intentando inocular em nossas crianças e adolescentes o vírus, nefando como nenhum outro, do desprezo pelas tradições e pelos antepassados. Desconhecem eles a lição de Renan no sentido de que todos os séculos da História de uma Nação são folhas de um só livro, de sorte que não se engrandece e não se enobrece uma Nação caluniando aqueles que a fundaram [2], assim como desconhecem a análoga preleção de Arlindo Veiga dos Santos, quando este bravo poeta e arauto da Fé e do Império proclama que “o Presente que nega o Passado não terá futuro” [3]. Aliás, ao desconhecer tais lições, esses agentes, conscientes ou não, da antitradição e da antinação se mostram coerentes com o pensamento marxista, o que não acontece, porém, com o Sr. Aldo Rebelo, Deputado Federal pelo Partido Comunista do Brasil, que, em opúsculo sobre os Construtores do Brasil [4], faz justiça a grandes vultos da História Pátria em regra demonizados pela “historiografia” marxista, a exemplo de D. Pedro I, de José Bonifácio, do Duque de Caxias, do Almirante Tamandaré, da Princesa Isabel, do Barão do Rio Branco, de Plácido de Castro, de Felipe Camarão, de Henrique Dias, do Padre Manoel da Nóbrega, de Tibiriçá e do Bandeirante Raposo Tavares, adotando, pois, curiosamente, uma posição verdadeiramente nacionalista e mesmo tradicionalista...
Poucos vultos da História do Brasil têm sido tão atacados, achincalhados e satanizados quanto os Bandeirantes. E é justamente a eles que devemos a nossa extensão territorial, várias vezes maior do que aquela definida pelo Tratado de Tordesilhas em 1494. Daí Plínio Salgado, a quem chamamos algures “Bandeirante da Fé e do Império” e “encarnação viva do Espírito Bandeirante” [5], sendo importante ressaltar que a Doutrina por ele legada, o Integralismo, não é senão, em suas próprias palavras, a “última expressão do espírito bandeirante” [6], daí Plínio Salgado dizer que para que sejamos dignos da obra imperecível e do sacrifício dos Bandeirantes e para que nosso nome não seja amaldiçoado pelas gerações futuras, devemos fazer do gigantesco território conquistado palmo a palmo por esses Homens fortes, bravos e abnegados uma Nação unida, forte e respeitada, condenando vigorosamente os separatistas, renegadores da “herança de honra dos Bandeirantes” [7].
Os Bandeirantes de São Paulo do Campo de Piratininga foram, como salienta Oliveira Vianna, “a nobreza paulistana”, “nobreza guerreira” e “não de riqueza”, isto é, nobreza cujos títulos de nobilitação estavam em seus feitos como sertanistas e não nas riquezas por eles acumuladas, sendo “nobres porque bravos – e não porque ricos”. Esses “caudilhos do sertão”, componentes, pois de uma “aristocracia de guerreiros”, tinham, ainda na expressão do autor de Instituições Políticas Brasileiras, “a preferência, reservada a toda e qualquer nobreza, para os cargos da governança”, podendo se inscrever nos “livros de S. Majestade” justamente porque podiam “exibir os seus grandes feitos no sertão, as suas mais notáveis gestas de bandeirantes” [8].
Em que pese a vontade, aliás natural e legítima, dos Bandeirantes, de enriquecer e descobrir tesouros no sertão, a causa do Bandeirismo é, consoante salienta Félix Contreiras Rodrigues, “essencialmente moral”, estando “presa ao imenso sonho paulista de conquistar para seu rei (...) um imenso império, que tivesse por divisa os mais claros limites naturais – o Atlântico, o Prata, o Paraná, o Paraguai, os Andes e o Amazonas” [9]. Ademais, para compreender o nobre e elevado espírito dos Bandeirantes Paulistas, basta recordar, ainda no dizer do sociólogo gaúcho, “quantos e quantos habitantes de Piratininga, dos das suas melhores linhagens, abandonaram seus lares e seus haveres para levarem ajuda aos Nordestinos, quer contra os Holandeses, quer contra os Cariris, e os Guerens, quer contra os Negros de Palmares. (...) E a São Paulo devemos esse primeiro alinhavo da nacionalidade, posto que nunca regateou sua proteção a qualquer ponto da Colônia que precisasse dela” [10].
No mesmo sentido, João de Scantimburgo faz sublinhar, em sua obra Os Paulistas, de 1982, o profundo “sentido de missão” que revestia a “formidável organização militar” em que se constituía a Bandeira, observando que os mais notáveis historiadores das Bandeiras, a exemplo de Afonso d’Escragnolle Taunay, Alfredo Ellis Junior, Paulo Prado e Cassiano Ricardo, não foram buscar na Tradição Portuguesa a origem da vocação missionária dos Bandeirantes, continuação daquela vocação missionária que moveu Portugal e caracterizou toda a ação dos Portugueses, isto é, do dever de dilatar a Fé e o Império. Sem pretender entrar na “querela teológica da predestinação”, o autor de Os Paulistas e de Tratado Geral do Brasil pondera que há, em determinadas fases da História, nações predestinadas, havendo sido Portugal uma de tais nações. Parece ter sido a Nação Portuguesa, com efeito, “escolhida pela Providência para criar um grande Império, pela Contra-Reforma opor-se à Reforma, e erigir nos trópicos uma nação continental, cujo destino apenas ainda se delineia, mas que, provavelmente, será decisivo nos tempos futuros” [11].
Muitos anos antes de Scantimburgo, já havia Plínio Salgado compreendido, integralmente, o verdadeiro sentido e a verdadeira origem da missão dos Bandeirantes, prelecionando, em sua obra Nosso Brasil, de 1937, que a História da Nação Brasileira, “como continuidade da vida de uma das mais cavalheirescas nações europeias”, não tem o seu início em 1500, mas sim no momento da fundação da Nação Portuguesa e que todas as glórias de Portugal até 1822 são patrimônio comum a todos os descendentes dos heroicos cavaleiros da Reconquista e das Cruzadas, dos magnos cientistas que desenvolveram a arte da navegação, dos nautas que enfrentaram e venceram os mares ignotos, “dos descobridores do caminho das Índias, dos soldados, marujos, escritores e poetas, que foram os primeiros europeus a atingirem a costa oriental da África, os extremos da Ásia e as ilhas misteriosas do Pacífico” [12].
Em seguida, frisa o autor de Como nasceram as cidades do Brasil que “essa tradição de inteligência, de coragem, de universalismo, de sonhos grandiosos e de fé sequiosa por dilatar o Reino do Cristo, continuou no Brasil, plasmando o caráter, a consciência dos Brasileiros. O desbravamento dos nossos sertões pelos Bandeirantes, a reconquista do solo pátrio ocupado pelos Holandeses e pelos Franceses, a evangelização levada às tabas selvagens, o cruzamento das raças americana, africana e europeia, sob a inspiração da igualdade humana perante Deus, tudo isso foi continuação de uma história que principiou quando D. Afonso Henriques, em 1140, desembainhando a sua espada ensinou-nos, por todo o sempre, que devemos bater-nos com ardor e denodo por Cristo e pela Nação” [13].
No mesmo sentido, o assinalado pensador, escritor e Homem de ação patrício, em discurso proferido a 13 de junho de 1960, por ocasião da entronização da imagem de Cristo no plenário da Câmara dos Deputados, observa, em magistral discurso, que os Bandeirantes “levaram Cristo no coração, como os cruzados” e que:
“Na continuação da obra de cruzada de Portugal pelos oceanos do mundo, eles, através de nossos sertões, levaram as imagens de Cristo em seus alforjes, para, quando atacados pelas moléstias tropicais, feridos pelas serpentes e sentindo aproximar-se os limites da vida terrena, tivessem o consolo, na solitude imensa dos sertões, de beijar aquela imagem, erguendo o pensamento bem alto, aprofundando-se no sentimento da fé cristã e morrendo legando seus ossos como balizas para as novas arrancadas bandeirantes da Pátria brasileira , que agora se reinicia, neste instante histórico da fundação da nova Capital, da marcha para oeste. Ossadas que ficaram para sempre marcando a nossa capacidade de agir, de lutar, de vencer, vanguardas perdidas indicando-nos os eternos caminhos da destinação cristã da Pátria brasileira” [14].
No ano seguinte, em monumental discurso proferido na Câmara dos Deputados, em Comemoração ao Dia de Ação de Graças, Plínio Salgado agradece a Deus por nos haver feito compreender que a sua Santa Cruz deve andar, deve navegar, deve “ir de país em país, dilatando a fé e o Império – a fé em Cristo e o Império de Sua Lei -” e também por haverem nossos antepassados, os Bandeirantes, “com rudes botas, chapelões desabados e facão à cinta, dilatado este imenso Império e nos legado este vasto patrimônio territorial” [15].
Isto posto, faz-se mister assinalar que o fenômeno do Bandeirantismo, embora tenha tido, inegavelmente, seu principal centro em São Paulo, se fez presente em diversos outros pontos do País, em particular na Bahia, no Pernambuco e no Pará.
O Bandeirantismo Baiano, centrado no poderoso clã dos Garcia d’Ávila, foi magistralmente retratado no romance As minas de prata, do notável escritor e também político e jurista cearense José de Alencar, criador de uma literatura verdadeiramente nacional e nacionalista, inspirada, antes de tudo, nos costumes e nas tradições do nosso Povo, e que, por sinal, descendia de sertanistas que haviam palmilhado os sertões em nome dos Garcia d’Ávila.
As minas de prata, obra que podemos situar entre as mais importantes do autor de O guarani e de Iracema, se constitui em um dos mais significativos romances brasileiros que retratam o fenômeno do Bandeirantismo, ao lado de A muralha, de Dinah Silveira de Queiroz, e A voz do Oeste, de Plínio Salgado, estes sobre o Bandeirantismo paulista. Registre-se, aliás, que tanto Dinah quanto Plínio eram descendentes de vultos do Bandeirantismo, descendendo a primeira do Bandeirante Carlos Pedroso da Silveira, que ocupou, dentre outros, os cargos de Capitão-Mor Governador e Ouvidor de Itanhaém, de Mestre de Campo Governador de Taubaté, Pindamonhangaba e Guaratinguetá e de Provedor dos quintos reais em Taubaté, Guaratinguetá e, após a extinção destas casas de fundição, em Parati, é considerado a mais importante figura de todo o primeiro ciclo do ouro nas Gerais [16] e é, ainda, personagem de A muralha. Já o segundo descendia de Manuel Preto, o “conquistador de Guairá”, reconhecido como um dos maiores sertanistas do século XVII, havendo contribuído consideravelmente para a expansão do Império nas terras que hoje compõem o sul do Brasil [17] e que é personagem de A voz do Oeste.
Paulo Bomfim, poeta de São Paulo, de sua História e de sua Tradição, lançou, em 1960, a ideia da criação do “Dia do Bandeirante”. Afonso d’Escragnolle Taunay, Alfredo Ellis Júnior, Tito Lívio Ferreira, Guilherme de Almeida e Júlio de Mesquita Filho emprestaram “o prestígio de seus nomes ao movimento” [18]. Este último escreveu, com efeito, no jornal O Estado de São Paulo, a 16 de novembro daquele ano, um artigo intitulado Notícia Nova:
“Atendendo ao apelo de um poeta, um governador resolve criar condições para que São Paulo se debruce sobre seu passado. Por decreto do governo do Estado [do Governador Carvalho Pinto], foi instituído em São Paulo o “Dia do Bandeirante”, destinado a marcar o início da “Semana do Bandeirante” que é comemorada nos principais núcleos de bandeirantismo do Estado, tem por fim acentuar “a importância do bandeirismo na formação da nacionalidade brasileira, notadamente o sentido histórico, geográfico e humano do movimento sertanista de São Paulo (...)
“Essa pois, é uma notícia que escapa inteiramente à rotina do jornalismo cotidiano. Que nasceu do apelo de um poeta, e que se transformou em decreto pela compreensão de um chefe de Estado” [19].
Mais tarde, o Dia do Bandeirante se tornou nacional. Infelizmente, porém, pouquíssimos são os brasileiros que sabem de tal dia e menos numerosos ainda são aqueles que o celebram. Tendo em vista, pois, a relevância dos Bandeirantes para a História e para a Tradição Nacional e conscientes de que esses bravos soldados da Fé e do Império devem servir de exemplo a todos os verdadeiros patriotas e nacionalistas deste vasto Império, que existe graças especialmente a eles, proclamamos a imperiosa necessidade de celebração do Dia Nacional do Bandeirante. E defendemos, ademais, a igualmente imperiosa necessidade de vivificação do Espírito Bandeirante em todos os rincões da Pátria, ressaltando que o Espírito Bandeirante não é senão o Espírito da Nobreza de que tanto temos falado e que tanto temos oposto ao nefando Espírito Burguês ora dominante no Mundo.
Que o Espírito Bandeirante inspire o nosso Nacionalismo, Nacionalismo sadio, justo, ponderado, equilibrado e construtivo, alicerçado na Tradição e tendente ao universalismo, que não pode e não deve ser confundido com o internacionalismo burguês e apátrida do liberalismo e do marxismo, sendo, antes, o universalismo cristão tão bem praticado na Europa durante a denominada Idade Média. E que os Bandeirantes nos abençoem e caminhem conosco em nossa árdua porém gloriosa Marcha por Cristo e pela Nação, pela Fé e pelo Império!
#Victor Barbuy
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